segunda-feira, 3 de outubro de 2016

Adeus Padre Zé Maria

Conheci o Padre Zé Maria, nos últimos meses de vida. Não tive o prazer de o conhecer quando ainda tinha uma saúde de ferro, e onde lutava contra tudo e todos para manter a casa do Gaiato.

Conheci-o em Junho, e desde logo o olhar daquele homem impressionou-me. 
O Padre Zé Maria, tinha um fé inabalável, ele falava de deus com uma convicção e com uma sinceridade que poucos o fazem. 
O Padre sabia da minha falta de fé e de não acreditar no deus dele, no entanto, nunca, mas nunca me condenou. Disse-me várias vezes "ainda vais a tempo, minha filha, um dia vais encontrar.". É verdade, por ele fui à missa dos 25 anos da Casa e onde fiz questão de lhe dizer que estava ali por ele, vi um sorriso maroto e com o seu ar já frágil "e eu agradeço".
Deste Padre, eu conheço os sorrisos, as gargalhadas silenciosas que ele dava ao ouvir uma piada, e vi muito beijo. Sempre que almocei com ele, não havia dia em que os filhos não fossem pedir mimos. Mesmo doente e frágil, nunca recusou um beijo e um abraço. Na Casa, era constante os mimos que ele recebia por parte de todos os filhos, sabia os nomes de todos, os seus feitios e até descobria quem tinha feito disparates.
Quem o visse, mesmo frágil, diriam sempre que era apenas velho, mas não, era já muito doente, mas mesmo doente fazia questão de estar presente nas acções da Casa.
Estive com ele nas últimas semanas, e sempre teimoso, continuava a sair da cama para cumprimentar os visitantes.

Quis assim o destino, levá-lo e deixar aqui toda a sua obra. Olho para as centenas de filhos que ele deixou, com um olhar perdido, tristes, alguns inconsoláveis e penso sempre, ele não morreu, ele está ali, em cada canto, em cada teimosia, em cada menino resgatado da miseria e que consegue seguir o seu rumo, ele está ali, a lutar por todos.
Vi ali os mais velhos a chorar, e onde tive a oportunidade de me agarrar a uns quantos e senti o choro deles. Um sofrimento real. Vi também, pela primeira vez, uma aproximação dos meus afilhados a pedirem-me colo, um deles, o mais esguio de todos, até me deu a mão para o acompanhar. Tentei falar, porque eu sou assim, porque enfrento, mas nenhum sabia o que fazer, estavam simplesmente ali, sem saber o futuro, onde mais uma vez tinham sofrido uma rasteira.
Não acredito em deus, mas acredito na bondade, acredito em pessoas verdadeiramente boas, e ele era. Eu vi nos olhos dele. O Padre Zé Maria, deixou tudo, para se dedicar a esta obra que ele acreditava, e que salvou e salva tanta criança. 
A Casa do Gaiato de Moçambique, não é só uma instituição de rapazes, é uma escola, é uma casa, é amor. Ali temos uma grande familia onde todos se tratam por "mano" e onde temos a mãe e o pai. É uma familia de verdade, onde se dá uma educação e as regras para depois poderem ganharem asas. É maravilhoso assistir às visitas constantes dos Gaiatos adultos e dizerem que regressam sempre a casa. É de facto uma casa, uma familia e muito amor.
Por isso acredito que ele não morreu, ele está nos corações de todos os que conviveram com ele, ele está em toda a sua obra, ele está em todos os Gaiatos, ele está na ali, simplesmente ali, na casa do Gaiato.

Da minha parte digo, Adeus Padre Zé Maria!!! E da minha parte e do meu gaiato, obrigada por me ter aceite nesta sua familia!

2 comentários:

  1. Grande post... "nosso pai foi e sempre será o melhor pai do mundo"!

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    1. Oh Bene...saber que este texto chegou a um de voces, faz-me sentir tão "gaiata".!!! Obrigada por teres comentado!!!
      Bjs

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